São Paulo
Cantar “Evidências” a plenos pulmões para uma plateia emocionada que acompanha todos os versos como se fosse a própria história sendo narrada através daquela letra e melodia. Não, não estamos descrevendo uma sexta-feira qualquer em um dos muitos karaokê onde a música de Chitãozinho e Xororó ganhou status de hino extraoficial do Brasil, mas de uma dos momentos mais aguardados de “As Aventuras de José e Durval”.
A série de oito episódios, que estreia nesta sexta-feira (18) no Globoplay, narra a trajetória da dupla sertaneja —da infância pobre, quando os dois meninos ainda usavam seus nomes de batismo e precisavam caçar pombos para ter o que comer, até o começo da fama, com suas músicas estourando nas rádios de todo o país.
Na produção, os cantores são vividos por outra dupla de irmãos: os atores Rodrigo Simas, 31, e Felipe Simas, 30. A opção, segundo o diretor-geral da série, Hugo Prata, não foi exatamente pelas semelhanças físicas, mas pela forma como eles poderiam internalizar a história.
“Nunca foi um concurso de sósias”, explica Prata. “A gente precisava achar atores que tivessem a essência dos personagens e, nesse aspecto, virem dois irmãos que têm características muito diferentes foi uma grata surpresa. O Rodrigo é muito parecido com Chitão, e o Felipe é muito parecido com o Xororó. Não tinha como um fazer o personagem do outro, sabe?”
Os atores contam que, antes de começar a gravar, tiveram receio de interpretar duas figuras que são extremamente conhecidas pelo público. “A direção achou melhor a gente não conversar com eles de cara e nos deu a licença poética de fazermos o meu José e o Durval do Felipe”, conta Rodrigo. “Mas claro que a gente estudou, conversou com eles e assistiu muito às entrevistas deles mais jovens e aos shows que eles faziam porque estávamos fazendo eles lá atrás, né?”
Com carreiras que nunca haviam se cruzado com tamanha intensidade na frente das câmeras, eles fizeram uma preparação que privilegiou a convivência e a criação de um sentimento de dupla. “Talvez se a gente ficasse preso à imagem deles, a gente não experimentaria enquanto irmãos”, avalia Felipe. “Eu acho que a relação deles enquanto irmãos é mais profunda do que simplesmente copiar os trejeitos.”
Para se transformar nos retratados, a caracterização recriou os característicos mullets que a dupla original ajudou a popularizar em todo o país nos anos 1980. “A gente dava bastante risada, principalmente quando estávamos experimentando. A gente se olhar e falava: ‘Meu Deus!’ (risos)”, revela Rodrigo. “Nossos cabelos estavam mais longos e tinha aplique e meia peruca; em algumas fases, tinha a meia peruca mais a peruca de cabeça… Então era algo que a gente tinha que usar nosso favor, porque tinha bastante coisa nessas cabeças.”
Já no quesito musical, os desafios foram mais dramáticos. “Foi um trabalho muito físico, de se encaixar corporalmente nas vozes de Chitãozinho e Xororó, a gente ralou”, conta Felipe. “Eu tenho perdido a voz com mais facilidade; mas é uma cicatriz que eu carrego com muita honra, porque não tem como você fazer a voz de Xororó e achar que vai sair ileso de algo assim.”
“Toda vez que a minha garganta fica dolorida eu sei que foram aqueles 25 takes que a gente fez para cantar ‘Evidências’, mas artisticamente foi um dos momentos mais potentes da minha vida, então o que que é uma garganta doída, sabe?”
Isso porque Xororó usa um tom muito mais agudo que o do ator, o que se explica pela relação que ele tinha com a mãe, Araci. Na série, a personagem é vivida por Andréia Horta, 40. “Desde a infância, tinha uma coisa de o Durval de cantar no mesmo tom da mãe”, conta a atriz. “Ele ficava observando a mãe cantar, enquanto o José tinha mais essa coisa com o pai. Então essas ligações minha com o Felipe e com o Pedro Lucas [que faz o personagem na infância] era diferente dentro das nossas cenas, foi maravilhoso.”
A série foi vista e aprovada pelos biografados, que participaram ativamente da divulgação. Apesar disso, o diretor afirma que a dupla não interferiu na forma como a família é mostrada —nem sempre com tintas positivas. Mário, o pai da dupla interpretado por Marco Ricca, trai a mulher, que desenvolve uma esquizofrenia nervosa e é internada à força. Já Chitãozinho se apaixona por uma prostituta antes de conhecer a mãe de seus filhos, enquanto Xororó desafia o chefe que não queria lhes deixar cantar.
“A gente tinha que esquecer que eles estavam aí, senão ficaríamos loucos”, afirma Prata. “E da parte deles foi sensacional, porque eles nos deram essa liberdade. Eles não acompanharam. Eles não leram os episódios. A gente escreveu e filmou. Eles não sabiam que a gente fez, eles foram assistir só depois pronto. Então acho que a série tem essa separação entre a realidade e a nossa ficção.”
Fonte: Folha de SP
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